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A colelitíase é uma das patologias gastrointestinais mais prevalentes no mundo, acometendo cerca de 10% da população.

A colelitíase é a principal patologia das vias biliares, sendo caracterizada pela presença de cálculos no interior da vesícula.

Os cálculos biliares são divididos em cálculos pigmentados, cálculos de colesterol e cálculos mistos. Os cálculos de colesterol correspondem a cerca de 70% dos cálculos da vesícula biliar, e os mesmos são compostos por mais de 50% de cristais de colesterol, associados a sais de cálcio, pigmentos da bile, proteínas e ácidos graxos. A grande maioria deles é radiotransparente e, por esse motivo, a tomografia computadorizada e a radiografia não são os exames de escolha para realizar o diagnóstico.

Os cálculos pigmentados são subdivididos em dois. Os cálculos negros contêm em sua composição bilirrubinato puro, carbonato e fosfato de cálcio. Já os cálculos marrons contêm sais de cálcio, bilirrubina desconjugada, proteínas e, em menor quantidade, colesterol. Esse ultimo geralmente está associado à infecção bacteriana.

A formação dos cálculos de colesterol é baseada em três estágios fundamentais, sendo eles o aumento da produção de colesterol, supersaturação da bile e nucleação. Para que eles se formem, tudo se inicia com o aumento da concentração de colesterol e, consequentemente, com a supersaturação da bile, no qual culmina com a nucleação de cristais de colesterol, promovendo assim o crescimento dos cálculos biliares.

Por sua vez, os cálculos pigmentados são formados em estados como o de aumento da hemólise, no qual há um aumento da oferta de substrato para a síntese e excreção de sais biliares, fazendo com que estes precipitem na bile.

A colelitíase é uma doença com prevalência global, sendo mais comum no sexo feminino quando em comparação com o masculino. Segundo a literatura, podemos citar os cinco principais fatores de risco utilizando os “5 F’s”:

Além desses, podemos citar outros fatores de risco, tais como a predisposição genética, sedentarismo, gestação, contraceptivo oral e/ou terapia de reposição hormonal, dislipidemia, rápida perda ponderal, nutrição parenteral, lesão da medula espinhal, cirrose e diabete mellitus.  

A grande maioria dos pacientes portadores de colelitíase são assintomáticos e o seu diagnóstico ocorre ao acaso. Estima-se que a taxa de conversão de um paciente assintomático em sintomático fica em torno de 2 a 3% ao ano.

Nos pacientes sintomáticos a principal queixa é a dor, no qual recebe o nome de cólica biliar. A dor ocorre por consequência de uma obstrução temporária do ducto cístico, geralmente após a ingestão de refeições copiosas, uma vez que há o estímulo da enzima colecistoquinina (CCK), e esta estimula a contração da vesícula biliar, levando a distensão do órgão. Após a cessação do estímulo enzimático, a vesícula se relaxa, a obstrução se desfaz e a dor lentamente diminui.

A cólica biliar tende a se localizar no epigástrio ou, mais comumente, no hipocôndrio direito, apresentando uma piora entre 15 a 30 minutos após a refeição, podendo irradiar para a escápula. A cólica biliar tende a melhorar entre 5 a 6 horas após o seu início. Náuseas e vômitos também podem acompanhar a dor. Após a primeira crise de cólica biliar, a tendência é que novos episódios ocorram, aumentando o risco de complicações, principalmente a colecistite aguda.

Ao realizar o exame físico, o paciente pode apresentar abdome distendido, com dor e defesa muscular no hipocôndrio direito. Entretanto, o sinal de Murphy classicamente descrito na colecistite aguda, não se observa na colelitíase.

Os exames laboratoriais, mesmo durante a crise de cólica biliar, tendem a ser normais. A leucocitose sem desvio a esquerda pode até ocorrer na colelitíase, porém, a presença de formas jovens (bastões, mielócitos e metamielócitos) deve levantar a suspeita de uma inflamação mais grave.

O diagnóstico da colelitíase é habitualmente feito por meio de ultrassonografia. Como os cálculos biliares são acusticamente densos, eles acabam refletindo as ondas do ultrassom, projetando a sombra acústica. Além disso, as litíases biliares não estão aderidas a parede da vesícula, no qual acabam movendo-se com a mudança de posição do paciente. A lama biliar apresenta ecogenicidade, porém não possui sombra acústica.

A tomografia computadorizada abdominal apresenta um papel bem limitado quando se fala em diagnóstico de colelitíase. Tal exame deve ser solicitado somente nos casos em que há a necessidade de avaliação da árvore biliar extra-hepática e na suspeita de neoplasia de vias biliares/vesícula biliar.

Toda colelitíase sintomática possui indicação cirúrgica. Desse modo, está indicado a colecistectomia para todos os pacientes sintomáticos já na primeira ocorrência de cólica biliar. Com a evolução das técnicas cirúrgicas a colecistectomia convencional aberta foi substituída pela colecistectomia laparoscópica, uma vez que possui vantagens, como por exemplo a alta precoce, menos infecções das incisões, retorno precoce ao trabalho e menor dor.

A colecistectomia profilática é um tema um pouco controverso na literatura, contudo, se recomenda para alguns casos especiais, tais como pacientes que serão transplantados, portadores de obesidade grau 3, durante cirurgias abdominais por outra indicação, portadores de anemia falciforme, esferocitose, situações de risco elevado de câncer de vesícula biliar (cálculos > 25 mm, vesícula em porcelana ou pólipos na vesícula com rápido crescimento ou maiores do que 1 cm) e pacientes portadores de microcálculos.

Nos pacientes com contraindicações absolutas ou relativas ao procedimento cirúrgico, está indicada como principal opção de tratamento a litotripsia extracorpórea por ondas de choque (LECO). Esse tratamento não cirúrgico pode ser empregado em pedras únicas de 5 mm a 20 mm, com uma taxa de recorrência de 20%.

Para os cálculos menores a 5 mm, a terapia farmacológica é a opção a ser utilizada. A combinação dos ácidos quenoeoxicolicos e ácido ursodesoxicólico (UDCA) ou somente o UDCA atuam na solubilização do colesterol presente na superfície do cálculo. Ademais, age diminuindo a absorção intestinal de colesterol e melhorando o esvaziamento da vesícula biliar. A taxa de sucesso varia de 30 a 50%.

A prevenção da colelitíase é indicada para pacientes com fatores de risco para desenvolvimento de cálculos biliares. O médico pode recomendar medidas para manutenção de peso ideal, adoção de hábitos de vida e alimentação saudáveis e prática de atividade física. A prevenção farmacológica não é recomendada.

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