Estratificação do risco cardiovascular
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Antes de elegermos o tratamento adequado para o paciente hipertenso, devemos sempre considerar o risco cardiovascular individualmente, uma vez que irá influenciar diretamente na terapêutica em questão.
Estratificação do risco cardiovascular
É de conhecimento geral a relação direta entre o aumento da pressão arterial (PA) e o risco de doença cardiovascular (DCV). A PA atua de forma sinergética com outros fatores de risco (FR), no qual culmina na elevação do risco cardiovascular. O aumento modesto de vários FR pode desencadear maior incremento no risco cardiovascular quando comparado com a elevação acentuada de apenas um.
A classificação do risco cardiovascular depende dos níveis de PA, dos fatores de risco adicionais, da presença de lesões de órgãos-alvo (LOA), existência de DCV, doença renal crônica (DRC) e/ou diabete mellitus (DM). Diferentes escores foram desenvolvidos e vêm sendo aplicados para classificar os pacientes hipertensos em categorias de baixo, moderado e alto risco cardiovascular. Os pacientes que apresentam lesões de órgão-alvo, doença cardiovascular ou renal documentada e diabetes já são considerados como sendo de alto risco cardiovascular. Os demais pacientes, para serem classificados, deverão ser avaliados de acordo com a quantidade de fatores de risco que eles apresentam.
Fatores de risco cardiovascular
A baixo é possível observar os fatores de risco cardiovascular descritos na diretriz brasileira de hipertensão arterial de 2020.
Fatores de risco |
Sexo masculino |
Idade Homens ≥ 55 anos ou mulheres ≥ 65 anos |
Dislipidemia Colesterol total > 190 mg/dLLDL > 100 mg/dLHDL < 40 mg/dL em homens ou < 46 mg/dL em mulheresTriglicérides > 150 mg/dL |
Obesidade IMC ≥ 30 kg/m²Circunferência abdominal > 80 cm em mulheres ou > 90 cm em homens. |
Tabagismo |
História familiar positiva de doença cardiovascular precoce em parentes de 1ª grau Homens < 55 anos ou mulheres < 65 anos |
A idade e o sexo apresentam correlação linear com hipertensão arterial e risco de complicações cardiovasculares. Desse modo, o surgimento de DCV tende a ocorrer de forma mais precoce nos homens quando comparados com o sexo feminino.
A dislipidemia tem forte correlação com o surgimento de placas ateromatosas coronarianas, em especial a diminuição dos níveis de HDL e o aumento das concentrações de colesterol total, LDL e triglicérides. Dito isso, o risco cardiovascular tende a aumentar nessas situações.
Os critérios de obesidade devem ser observados com atenção, principalmente quando falamos de circunferência abdominal, pois existem distintos parâmetros criados por diferentes instituições. Os critérios mais aceitos são os da International Diabetes Federation (IDF), da National Cholesterol Education Program (NCEP ATP III) e da organização mundial da saúde (OMS). A diretriz brasileira de hipertensão arterial de 2020 considera os critérios da IDF, contudo a prova do Revalida sempre utilizou os parâmetros da NCEP ATP III.
A nicotina, presente na grande maioria dos tabacos, é um importante fator de risco para o desenvolvimento de DCV, uma vez que atua no sistema nervoso causando aumento da frequência cardíaca e aumento nos níveis pressóricos. Além disso, o tabagismo também contribui para o surgimento de quadros trombóticos.
Lesão em órgão alvo
A estimativa de risco no paciente hipertenso deve ser complementada pela identificação da presença de LOA, que são frequentes e muitas vezes subdiagnosticadas. Tais lesões podem ser vistas na tabela a seguir:
Lesões de órgãos-alvo |
Hipertrofia ventricular esquerda |
Espessura médio-intimal da carótida > 0,9 mm e/ou placa carotídea |
Velocidade da onda de pulso carótido-femoral > 10 m/s |
Índice tornozelo-braquial < 0,9 |
Doença renal crônica estágio 3 TFG-e entre 30 e 60 ml/min/1,73m² |
Microalbuminúria Albuminúria entre 30 e 300 mg/24h ou relação albumina/creatinina urinária entre 30 e 300 mg/g em amostra isolada |
Retinopatia leve (graus 1 e 2) Estreitamento arteriolar e alteração do reflexo arteriolar mais acentuados e cruzamento arteriolovenular |
Presença de doença cardiovascular e renal
Com o passar do tempo, as lesões de órgão-alvo tendem a evoluir e teremos então doença cardiovascular e renal estabelecidas. Tais patologias determinam o risco aumentado de eventos cardiovasculares no hipertenso.
Doença cardiovascular e renal estabelecidas |
Doença cerebrovascular AVC isquêmico ou ataque isquêmico transitório Hemorragia cerebral |
Doença arterial coronariana Angina estável ou instávelInfarto agudo do miocárdioRevascularização miocárdica |
Insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida ou preservada |
Doença arterial periférica dos membros inferiores sintomática |
Doença renal crônica estágio 4 ou 5 TFG-e < 30ml/min/1,73m² Albuminúria > 300mg/24h ou relação albumina/creatinina urinária > 300mg/g em amostra isolada |
Retinopatia avançada (graus 3 e 4) Hemorragias retinianas, exsudatos, papiledema |
Classificação do risco cardiovascular
A tabela de classificação do risco cardiovascular é fundamental na estratificação do paciente hipertenso. A relação dos valores pressóricos com os fatores de risco, lesão de órgão-alvo, doença cardiovascular ou renal e diabetes, nos auxiliam a determinar o quão grave é a situação do paciente e qual a medida terapêutica deve ser seguida.
Após anamnese e exames detalhados, as informações obtidas devem ser alocadas na tabela da diretriz brasileira de hipertensão, para aí então classificarmos o risco cardiovascular. O quadro da estimativa do risco cardiovascular pode ser observado a seguir.
Importante mencionar que essa classificação é dinâmica e pode ser modificada de acordo com o melhor ou pior controle dos níveis pressóricos e dos fatores de risco.
Referência:
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