Insuficiência cardíaca na clínica médica

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Insuficiência cardíaca é uma síndrome clínica multifatorial, na qual o coração é incapaz de bombear sangue de forma a suprir às necessidades metabólicas do organismo, ou pode fazê-lo somente com elevadas pressões de enchimento.

Classificação

A insuficiência cardíaca (IC) pode ser classificada de acordo com a fração de ejeção, a gravidade dos sintomas e o tempo e progressão da doença.

  • Classificação de acordo com a fração de ejeção

Essa classificação tem como critério analisar o potencial de ejeção do ventrículo esquerdo, ou seja, o volume de sangue que o ventrículo esquerdo (VE) envia para a circulação sistêmica após cada contração.

De tal forma, podemos classificar a IC em:

  • Insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada (ICFEP), na qual se observa em pacientes cuja fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) é normal, ou seja, ≥ 50%.
  • Insuficiência cardíaca com fração de ejeção intermediária (ICFEI), onde se observa em pacientes cuja FEVE está entre 40 e 49%.
  • Insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida (ICFER), na qual se observa em pacientes com FEVE é < 40%.

Identificar e diferenciar os pacientes de acordo com a FEVE é importante, visto que eles diferem em relação às suas principais etiologias, às comorbidades associadas e, principalmente, à resposta à terapêutica.

  • Classificação de acordo com a gravidade dos sintomas

A New York Heart Association (NYHA) propôs uma classificação de acordo com a gravidade dos sintomas apresentados pelo paciente e varia desde a ausência de sintomas até a presença de sintomas mesmo em repouso. Tal categorização é dividida em 4 estágios e pode ser visualizada na tabela a seguir:

Classificação funcional, segundo a New York Heart Association
ClasseDefiniçãoDescrição geral
IAusência de sintomasAssintomático
IISintomas leves durante atividades do cotidianoSintomas leves
IIIAtividades menos intensas que o habitual causam sintomas. Limitação importante, porém, confortável em repousoSintomas moderados
IVIncapacidade de realizar qualquer atividade sem apresentar desconforto. Sintomas surgem até em repousoSintomas graves
Fonte: Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca Crônica e Aguda. 2018.

Esta classificação permite avaliar a condição clinica do paciente, auxilia no manejo terapêutico e tem relação com o prognóstico.

Classificação de acordo com a progressão da doença

A classificação por estágios foi proposta pela American College of Cardiology (ACC) e American Heart Association (AHA) e enfatiza o desenvolvimento e a progressão da doença. Tal classificação pode ser visualizada abaixo.

 Estágios da insuficiência cardíaca segundo ACC e AHA
EstágioDescrição
ARisco de desenvolver IC. Sem doença estrutural ou sintomas de IC
BDoença estrutural cardíaca presente. Sem sintomas de IC
CDoença estrutural cardíaca presente. Sintomas prévios ou atuais de IC
DIC refratária ao tratamento clínico. Requer intervenção especializada
Fonte: Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca Crônica e Aguda. 2018

Epidemiologia

A IC está presente em 1 a 2% da população adulta e sua prevalência aumenta com a idade. Tal patologia é a principal causa de internação hospitalar no Brasil e a sobrevida após cinco anos do diagnóstico é baixa, chegando perto dos 35%.

Segundo o estudo BREATHE, onde se observou hospitais públicos e privados de todo território brasileiro e de outros países, concluiu-se que a maior prevalência de IC aguda foi observada em idosos, predominantemente em mulheres, e que as principais etiologias de base foram isquêmica e hipertensiva.

Etiologia

A etiologia da IC difere de acordo com as diferentes regiões ao redor do mundo, e descobrir quais são os fatores que desenvolvem esta patologia é fundamental. A etiologia deve ser sempre buscada na história do paciente, no exame físico e por meio de exames complementares.

Quando pensamos em Brasil, a principal causa para o surgimento de ICFER é a cardiopatia isquêmica. Entretanto, a cardiopatia hipertensiva é a principal responsável pelo surgimento da ICFEI e ICFEP.

A insuficiência cardíaca direita esta relacionada ao aumento da pós-carga direita ou lesões da musculatura do lado direito. O aumento das pressões deste lado do coração pode ser decorrente das patologias pulmonares (sendo chamado nesse caso de cor pulmonale) ou sobrecarga das cavidades esquerdas.

Manifestações clínicas

Pacientes portadores de lesão do miocárdio (estágio B) podem se apresentar de forma assintomática desde que os mecanismos compensatórios estejam funcionando de maneira adequada.

A sobrecarga nas cavidades esquerdas leva a um aumento da pressão venocapilar pulmonar. Dito isso, tal elevação pode ultrapassar a capacidade de absorção dos vasos linfáticos e, consequentemente, produzir edema intersticial pulmonar, responsável por toda sintomatologia respiratória na IC (dispneia paroxística noturna, dispneia aos esforços, ortopneia, cansaço)   

Quando há sobrecarga nas cavidades direitas é possível observar congestão sistêmica, tais como turgência jugular patológica, refluxo hepatojugular, ascites e edema de membros inferiores.

O principal sintoma que leva os pacientes a procurarem auxilio médico é a dispneia aos esforços. Contudo, esta sintomatologia é vaga e necessita de uma maior investigação por parte do profissional da saúde. Deve-se investigar a presença de:

  • Dispneia paroxística noturna;
  • Ortopneia;
  • Tosse noturna;
  • Fadiga;
  • Distúrbios do sono;
  • Ausculta cardíaca: bulhas acessórias (B3 e B4) sopro mitral;
  • Estertores pulmonares e derrame pleural;
  • Turgência jugular patológica;
  • Hepatomegalia;
  • Aumento do volume abdominal;
  • Edema de membros inferiores;
  • Congestão da mucosa intestinal;
  • Ganho de peso;
  • Respiração de Cheyne-Stokes;

Dentre os sintomas mencionados a cima, a dispneia paroxística noturna, bulha B3 acessória e a turgência jugular patológica são os sinais mais específicos para o diagnóstico de IC.

Diagnóstico

A IC é uma síndrome na qual apresenta alterações na função cardíaca e, por esse motivo, resulta em sintomas e sinais de baixo débito cardíaco e/ou congestão pulmonar ou sistêmica, em repouso ou aos esforços.

O diagnóstico da insuficiência cardíaca é clínico e na maioria das vezes pode ser realizado através de um bom exame físico e anamnese. Contudo, pacientes crônicos podem ter a maioria dos sinais clínicos diminuídos por processos adaptativos e somente sinais como terceira bulha e sintomas como ortopneia podem ser observados.

Para o diagnóstico na prática clínica, os critérios de Framingham são os mais utilizados e consiste na busca por critérios maiores e menores. O diagnóstico se confirma na presença de dois critérios maiores simultâneos ou um critério maior e dois menores. Abaixo é possível visualizar a classificação.

Critérios de Framingham 
Critérios maioresCritérios menores
Dispneia paroxística noturnaEdema de tornozelo bilateral
Turgência jugular a 45ºTosse noturna
Refluxo hepatojugularDispneia aos mínimos esforços
Edema pulmonar agudoDerrame pleural
Estertores pulmonares crepitantes  Taquicardia
Cardiomegalia ao raio X de tórax Taquicardia
Galope de terceira bulha 
Fonte: Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca Crônica e Aguda. 2018

Exames complementários

  • Ecocardiograma

O ecocardiograma transtorácico está indicado a todo paciente portador de sinais e sintomas sugestivos de IC, é o exame de imagem de escolha para o diagnóstico. O exame possibilita avaliar a função ventricular sistólica e diastólica, as espessuras parietais, o tamanho das cavidades, a função valvar e o estado volêmico.

O método de Simpson é o mais fidedigno na avaliação da fração de ejeção, devendo ser utilizado preferencialmente pelos médicos. Entretanto, nem sempre será possível utiliza-lo pois necessita de uma visualização adequada dos bordos cardíacos para sua mensuração.

Não se recomenda a realização de ecocardiograma de forma rotineira nos pacientes com IC, mas sugere-se sua repetição naqueles pacientes que exibem mudança significativa de seu estado clínico. Após tratamento medicamentoso na qual modifica o prognostico do paciente, é aconselhado a realização de um novo ecocardiograma 3 a 6 meses.

  • Radiografia de tórax

A radiografia de tórax apresenta facilidade, baixo custo e ampla disponibilidade, e por esse motivo é utilizada na análise inicial dos pacientes com sinais e sintomas de IC para a avaliação de cardiomegalia e congestão pulmonar. O método tem maior valor no contexto da IC aguda, em que as alterações de congestão pulmonar são mais intensas.

A cardiomegalia pode ser avaliada através índice cardiotorácico (ICT). O calculo é obtido através da soma da maior distância da coluna vertebral até a sombra cardíaca à direita e à esquerda e dividir pelo maior diâmetro horizontal da caixa torácica. Se o valor alcançado for maior que 0,5, o paciente apresenta cardiomegalia.

Existem diversos achados radiológicos que demostram congestão pulmonar. Tais sinais podem ser vistos abaixo.

A inversão do padrão vascular é característico de edema intersticial dos lóbulos inferiores, onde a trama vascular fica mais evidente no ápice pulmonar.

Infiltrado intersticial pode surgir como borramento perivascular, borramento peribrônquico e infiltrado peri-hilar, sendo denominado comumente como “asa de borboleta”.

Derrame pleural ocorre de forma bilateral, porém tem maior predomínio à direita.

  • Eletrocardiograma em repouso

O eletrocardiograma de 12 derivações é recomendado na avaliação inicial de todos os pacientes com IC. A depender dos sinais obtidos no exame, diferentes tratamentos podem ser sugeridos. 

Ao analisar o eletrocardiograma (ECG) e observar um complexo QRS de maior amplitude, o médico deve analisar a derivação V1. Se o complexo estiver positivo pode-se pensar em bloqueio de rama direta (BRD), entretanto complexo negativo é sugestivo de bloqueio de rama esquerda (BRE).

  • Teste de esforço cardiopulmonar

A ergoespirometria permite avaliar de forma objetiva e quantitativa da capacidade funcional do sistema cardiopulmonar do paciente. O exame tem o intuito de avaliar o consumo de volume de oxigênio no pico do esforço (VO²), relação entre ventilação e produção do volume de dióxido de carbono (VE/VCO²) e ventilação oscilatória durante o esforço. Tal método é utilizado principalmente em pacientes com IC avançada, possuindo critério de avaliação prognóstica na triagem de pacientes candidatos à transplante cardíaco.

Exames laboratoriais

  • Peptídeo natriurético cerebral

O peptídeo natriurético cerebral (BNP) é um marcador de sobrecarga cardíaca cujo papel no diagnóstico de IC está bem estabelecido. Valores menores que 100 pg/mL tornam improvável o diagnóstico, contudo valores maiores a 400 pg/mL o diagnóstico é praticamente certo.

O NT-proBNP é uma molécula mais estável, possui maior meia-vida e é considerado melhor marcador de insuficiência cardíaca e sobrecarga volumétrica.

Embora não seja possível dispensar os exames de imagem para a confirmação diagnóstica, o uso do BNP auxilia de forma considerável na definição do diagnóstico de IC.

  • Hemograma

A anemia é um fator de descompensação importante na IC, e o hemograma auxilia no seu diagnóstico. Além disso, a presença de leucocitose pode indicar processo infeccioso, podendo ser esse o causador da descompensação.

  • Gasometria arterial

Se recomenda realizar gasometria arterial em pacientes com baixo débito cardíaco e/ou dificuldade respiratória. Além de avaliar o equilíbrio acidobásico e a oxigenação, fornece informações quanto à perfusão tecidual.

  • Troponina

A troponina possui valor prognóstico e por isso deve ser solicitada em toda admissão por IC aguda. Valores persistentemente elevados, na ausência de infarto agudo do miocárdio, estão associados à maior mortalidade.

  • Níveis de ferro

Grande parte dos pacientes com IC possui deficiência de ferro, mesmo na ausência de anemia, sendo um marcador de pior prognóstico. Deve-se dosar ferritina sérica e saturação de transferrina em todos pacientes com IC e em caso de deficiência, está recomendada a reposição por via intravenosa.

Tratamento

  • Tratamento não farmacológico

O tratamento não-farmacológico está indicado em todos os pacientes com IC, independente da FEVE. Tal metodologia consiste em uma série de cuidados e modificações de estilo de vida que se associam a um melhor prognóstico.

  • Programas multidisciplinares

Os programas multidisciplinares de cuidados visam melhorar a adesão e o autocuidado com o intuito de reduzir morbidade, hospitalizações e mortalidade por IC. Deve-se ressaltar para pacientes e cuidadores, as causas da IC, seu tratamento, o potencial de progressão clínica e a importância do autocuidado diário. Esta parte do tratamento é fundamental e considerada padrão-ouro para acompanhamento de pacientes com essa enfermidade.

  • Restrição de sódio

O consumo excessivo de sódio e o de fluidos associa-se ao agravamento da hipervolemia, constituindo fator de descompensação e risco de hospitalização em pacientes com IC crônica sintomática. Dito isso, a diretriz brasileira de insuficiência cardíaca recomenda a ingesta menor a 7 gramas de cloreto de sódio por dia (equivalente a 2,8 gramas de sódio).

  • Restrição hídrica

O tratamento com restrição hídrica apresenta dados controversos na literatura, e por isso a diretriz brasileira de insuficiência cardíaca não recomenda níveis específicos e detalhadas sobre o emprego de restrição hídrica em pacientes com IC.

  • Controle de peso e ingesta de alimentos

A obesidade e a sua duração têm correlação com desenvolvimento de remodelamento e queda da função sistólica ventricular esquerda, potencialmente reversíveis com a perda de peso. Dito isso, indivíduos com risco de padecer de IC devem buscar manutenção do peso corporal e uma dieta saudável. Entretanto, é de conhecimento geral, que a IC apresenta um fenômeno denominado “paradoxo da obesidade, no qual indivíduos com obesidade leve apresentam menor mortalidade e menores taxas de internação hospitalar do que pacientes com IMC dentro da faixa da normalidade.

O uso de acido graxo poli-insaturados n-3 apresentou modesta, porem significativa, redução na mortalidade por qualquer causa e no desfecho combinado de morte ou hospitalização por causa cardiovascular.

  • Imunização

A vacinação anual contra influenza e pneumococo a cada 5 anos nos pacientes portadores de IC sugere redução nas internações por doença cardiovascular e, consequentemente, menor mortalidade.

  • Atividade física

Programas de exercício na IC promovem progressivo aumento da capacidade funcional do paciente. A atividade física, quando empregada em pacientes NYHA II e III, melhora a qualidade de vida e reduz hospitalizações por IC.

  • Atividade sexual

Muitos pacientes com IC frequentemente relatam problemas sexuais e culpam os sintomas/medicamentos. A AHA, através de estudos, atestou segurança para pacientes com IC em classes funcionais I a II da NYHA, mas sugere que pacientes com IC descompensada ou avançada não devam ter atividade sexuais até que sua condição esteja estabilizada.

  • Planejamento familiar

A orientação de métodos contraceptivos deve ser individualizada com base na gravidade clínica. Pacientes com fração de ejeção gravemente reduzida e em classes funcionais III e IV devem ser desencorajadas a engravidar.

Tratamento farmacológico da ICFER

O tratamento da IC vem sendo discutido e diversos estudos já foram elaborados com o intuito reduzir a hospitalização e mortalidade dos pacientes. A maioria dos ensaios clínicos tem mostrado redução consistente de mortalidade cardiovascular com o tratamento apenas nos pacientes com ICFER.

O tripé clássico da terapia que modifica a mortalidade na ICFER são os inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA), betabloqueadores (BB) e os antagonistas dos receptores mineralocorticoides. Os diuréticos não atuam na redução da mortalidade, auxiliando apenas no controle dos sintomas.

  • Inibidores da enzima conversora de angiotensina e bloqueadores do receptor de angiotensina II

O sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA) é um mecanismo compensatório do organismo e tem como consequências a ocorrência de retenção hídrica e fibrose miocárdica. Os IECA atuam impedindo a formação de angiotensina II ao inibir a enzima conversora de angiotensina (ECA). Ao vetar o SRAA ocorre a diminuição da hipervolemia e promove o remodelamento reverso do ventrículo esquerdo.  Além de dificultar a formação de angiotensina II, os IECA prejudicam a degradação de bradicinina, na qual proporciona vasodilatação e auxilia ainda mais nos resultados satisfatórios do medicamento. Contudo, os níveis elevados deste hormônio é o principal fator da formação dos efeitos colaterais nos pacientes, sendo eles tosse e angioedema. Os principais representantes dos IECA usados na prática clínica são o captopril, enalapril, ramipril, lisinopril e perindopril.

Os bloqueadores do receptor de angiotensina II (BRA) atuam no receptor AT1, no qual impedem a união do hormônio e, consequentemente, a sua ação. Os principais BRA estudados na IC são o valsartan, candesartan e losartan.

Dentre os dois fármacos citados anteriormente, os IECA são a primeira opção nos pacientes sintomáticos e assintomáticos, e caso ocorra intolerância deverá ser substituído pelos BRA. O uso concomitante desses dois medicamentos implica em aumento significativo dos efeitos adversos (hipotensão, hipercalemia ou disfunção renal), e para minimizar a acontecimento destes, as drogas devem ser introduzidas em doses baixas e titulação progressiva, até atingir as doses-alvo.  

O aumento em até 50% da creatinina basal, ou valor absoluto de até 3 mg/dL, ou clearance da creatinina estimado > 25 mL/min/m² após a ingestão desses medicamentos é tolerável e não é necessário reduzir as doses dos fármacos. Contudo, se o potássio ultrapassar os valores de 5,5 mEq/L, ou a creatinina ultrapassar os valores de 3,5 mg/dL, ou clearance estiver < 20 mL/mim/m² deve ser considerada a suspensão do IECA ou do BRA. Nesses casos, a alternativa de terapia vasodilatadora é a combinação de nitrato com hidralazina.

  • Betabloqueadores

Os BB são considerados medicamento de primeira linha no tratamento da IC ao proporcionar efeito inotrópico e cronotrópico negativo, com o objetivo de reverter os efeitos tóxicos do hiperadrenergismo no coração e promove o remodelamento reverso, diminuindo assim os sintomas da IC em semanas ou meses após a introdução. O carvedilol, o bisoprolol e o succinato de metoprolol são os fármacos que apresentaram melhores resultados ao promover menor hospitalização, mortalidade e morte súbita. O nebivolol mostrou resultado satisfatório em pacientes maiores de 70 anos, porém menos satisfatório que os anteriores, devendo ser utilizado como alternativa terapêutica.

Os BB atuam em sinergismo com os IECA/BRA. Sendo assim, sempre que possível devem ser administrados juntos, em pacientes sintomáticos e assintomáticos, afim de evitar a progressão da doença. Pacientes com ICFER que apresentam fibrilação atrial (FA) tem boa resposta na utilização dos BB no controle da resposta ventricular, sendo a droga de escolha para tal. É contraindicado para pacientes que apresentem sinais de choque, sinais de baixo débito cardíaco, asma ou EPOC descompensados, bloqueio atrioventriculares avançados (BAV total, BAV 2º grau Mobitz II, BAV2:1) e doença arterial periférica sintomática.

O tratamento deve iniciar com doses baixas, com aumento progressivo a cada duas semanas, mediante monitorização dos sintomas. Caso haja acentuação dos sintomas, ajuste de diuréticos e vasodilatadores deve ser tentada antes de se considerar a redução da dose ou suspensão do BB. É contraindicado iniciar a terapia com BB durante descompensações da doença.

  • Antagonista dos receptores mineralocorticoides

No Brasil, a espironolactona é o medicamento utilizado desta classe e é indicado para pacientes ICFER com disfunção ventricular esquerda sintomática, ou seja, em classe funcional NYHA II a IV, em associação aos IECA/ BRA e betabloqueadores.

O uso da espironolactona em pacientes com insuficiência renal e níveis elevados de potássio deve ser realizado com cautela, necessitando de monitorização periódica. Segundo a Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca deve-se suspender o uso do medicamento quando o paciente apresentar insuficiência renal avançada (creatinina > 2,5 mg/dL) e em pacientes com hipercalemia persistente (em geral potássio > 5,9 mmol/L). O principal efeito colateral da espironolactona é a ginecomastia.

  • Inibidores da neprilisina e dos receptores da angiotensina (sacubitril/valsartana)

O sacubitril é um medicamento capaz de inibir a neprisilina, uma enzima que participa da degradação da bradicinina e dos peptídeos natriuréticos. Como já vimos anteriormente, níveis elevados de bradicinina fornecem resultados positivos aos pacientes portadores de IC. A associação de um BRA faz com que o SRAA seja interrompido, proporcionando um efeito anti-remodelamento.

O sacubitril/valsartana é recomendado em pacientes sintomáticos que não apresentam melhora mesmo em uso otimizada da terapia tripla. Nesses casos, é recomendado que faça a substituição do IECA ou BRA pelo sacubitril/valsartana. Ao realizar a troca, pacientes que estavam em uso do IECA devem esperar 36 horas para iniciar a nova medicação, tal medida visa diminuir a ocorrência de efeitos adversos. Pacientes em uso de BRA não necessita realizar esta espera.

As doses devem ser aumentadas progressivamente a cada 2 a 4 semanas, mediante monitoração da função renal, eletrólitos e sintomas hipotensivos até a dose alvo ser atingida. Os principais efeitos adversos observados na utilização desse medicamento é a piora significativa da função renal, hipercalemia, tosse e angioedema.

  • Nitrato e hidralazina

A associação de nitrato e hidralazina mostrou ser eficiente em pacientes com IC uma vez que possui efeitos venodilatador e arteriodilatador respectivamente. Tais efeitos reduzem a pré e pós carga ventricular, facilitando seu esvaziamento.

Quando comparado ao IECA e BRA, a associação de nitrato e hidralazina se mostrou inferior. Dito isso, o seu uso é recomendado em pacientes que possuem contraindicação ao uso de IECA ou BRA. Pode ser indicado também em associação a terapia tripla para pacientes com ICFER que permanecem sintomáticos (NYHA III e IV) mesmo com doses otimizadas. Isso é particularmente válido nos pacientes afrodescendentes.

  • Diuréticos de alça e tiazídicos

Os diuréticos são a classe terapêutica mais utilizada em pacientes com IC para alívio de congestão. O motivo para isso é o seu potencial diurético no qual causa um alívio da sobrecarga volêmica. Apesar disso, não existe nenhum estudo que demonstre que os diuréticos reduzem a mortalidade de pacientes portadores de IC crônica.

Estudos demonstram que o uso crônico dos diuréticos causa efeito adverso sobre o SRAA, gerando piores desfechos clínicos. Dessa forma, a Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca recomenda a utilização de doses pequenas capazes de controlar os sintomas de congestão, dando preferência sempre para os diuréticos de alça por possuir maior potência. Pacientes que permanecerem com sintomas de congestão mesmo após doses crescentes de diurético de alça, pode-se associar um diurético tiazídico para aumentar seus efeitos.

  • Tratamento farmacológico da ICFEI e ICFEP

Segundo a Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca não há estudos que evidenciem a diminuição da mortalidade e numero de hospitalizações em pacientes portadores de ICFEP submetidos a tratamento medicamentoso. Posto isso, a recomendação é o controle sintomatológico através do uso de diuréticos, visando aliviar os sintomas congestivos.

Pacientes classificados como ICFEI, cuja a melhora da FEVE ocorreu mediante utilização do tratamento farmacológico, devem manter a medicações utilizadas.  Nos demais pacientes, em geral, usa-se, pelo menos, betabloqueadores e IECA ou BRA.

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