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A EVALI – sigla em inglês para a lesão pulmonar induzida pelo vaping ou cigarro eletrônico – é recente, datada pela primeira vez no ano de 2019 por profissionais da saúde norte-americanos, e até hoje se discute sobre os riscos da utilização desses dispositivos.
- Introdução
No ano de 2004, os chineses desenvolveram o primeiro modelo de cigarro eletrônico e desde então se popularizou ao redor do mundo. A proposta inicial dos fabricantes era diminuir a incidência dos agravantes que o cigarro convencional causava, uma vez que há menor quantidade de substancias tóxicas e o dispositivo realiza a vaporização, deixando de lado a combustão.
Em 2007, os vapings e os cigarros eletrônicos invadiram o mercado norte-americano e desde então houveram modificações em seus dispositivos. Inicialmente os aparelhos eram produtos descartáveis, contudo, as novas gerações passaram a ser recarregáveis, facilitando a utilização de diversas substancias não controladas.
Na época atual, com a disseminação e a utilização em grande escala desses dispositivos, abre-se um espaço para debater sobre o impacto dos produtos de vaporização na saúde pública.
- Vapings e cigarros eletrônicos empregados na cessação do tabagismo.
Os cigarros eletrônicos tem sido utilizados, desde sua criação, como uma alternativa na cessação do tabagismo. Entretanto, é importante mencionarmos que estes dispositivos liberam quantidades importantes de nicotina e outros produtos não regulamentados em nosso país, muitas vezes não esclarecidas pelo fabricante. Outro fator a levarmos em conta é a comercialização proibida no Brasil, acarretando na venda clandestina e não controlada pelos órgãos de vigilância sanitária.
Recentemente surgiu no mercado os dispositivos chamados “Mods de pod”. Tais produtos possuem um formato de pen drive e são facilmente ocultáveis. O diferencial desse novo dispositivo é a entrega de sais de nicotina, permitindo que altos níveis de nicotina sejam inalados facilmente e com menor irritação quando comparados com a nicotina de base livre utilizados nos cigarros eletrônicos de gerações anteriores. Importante salientar que níveis elevados de nicotina são altamente viciantes e prejudiciais ao desenvolvimento cerebral, principalmente em idade jovem.
Os estudos científicos que analisaram os efeitos a longo prazo dos cigarros eletrônicos são inconclusivos até o momento, contudo, há evidencias científicas in vitro que relatam alterações na mucosa respiratória, assemelhando-se aos prejuízos causados pelos cigarros tradicionais. Dessa forma, ainda há dificuldade de classificar os dispositivos eletrônicos como medida alternativa do tabagismo e por esse motivo não devemos recomenda-lo, principalmente os que contém THC e aquele obtidos de origem informal.
- O que é EVALI?
EVALI é uma doença pulmonar relacionada ao uso de vape e/ou cigarros eletrônicos. Durante o ano de 2020 muito se discutiu sobre essa patologia após o aumento exponencial do uso desses dispositivos em todo o mundo. No final do ano de 2019, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) emitiu uma nota sobre essa situação onde citou mais de 2.800 casos de internação de jovens por EVALI e 68 mortes, divididos em mais de 50 estados norte-americanos. A maioria dos pacientes internados relataram utilizar a substância THC nos cigarros eletrônicos, porém alguns citaram fazer o uso exclusivo de nicotina.
Os pacientes internados realizaram testes laboratoriais, onde analisaram as amostras de fluido da lavagem broncoalveolar (BAL). As substâncias THC e acetato de vitamina E foram encontradas em alguns pacientes internados com EVALI, contudo, em outros não se observou tais produtos. Dessa maneira, não é possível descartar a contribuição de outro elemento químico para o desenvolvimento da doença.
O acetato de vitamina E, composto que costuma estar associado a produtos contendo THC, é utilizado como agente espessante em produtos de vaporização. Essa substancia é encontrada tanto em alimentos quanto no cigarro eletrônico. Quando ingerido, não ocasionam nenhum dano, em contrapartida, quando inalado o acetato de vitamina E interfere na função fisiológica pulmonar ao entrar em contato com fosfolipídeos e surfactantes do fluido de revestimento epitelial. Além disso, a decomposição dessa substância, decorrente do aquecimento, pode resultar na formação de compostos tóxicos, como o caso do ceteno.
Estudos americanos mostraram que os jovens são os mais acometidos pela epidemia de vaping, revelando uma alta no consumo dos dispositivos eletrônicos em até 900% entre os anos de 2011 e 2015. Em 2019, mais de 5,2 milhões de jovens americanos revelaram fazer uso de cigarros eletrônicos e/ou vape. Em contrapartida, o uso entre os adultos permaneceu inalterado entre os anos de 2014 a 2017 e um pequeno crescimento no ano de 2018, somando um total de 8,1 milhões de usuários. O uso entre os jovens pode ser explicado por vários fatores, tais como publicidade eficiente, sabores atraentes e fácil aquisição.
A partir desse panorama, o CDC busca evidenciar a origem da doença para minimizar futuros danos a sociedade. Diante dos fatos mencionados anteriormente, o que se pode aferir com certeza é que o uso da vaporização entre os jovens é inseguro e não deve ser aconselhado, independentemente da utilização de THC ou somente nicotina, pois ambas substancias prejudicam o desenvolvimento cerebral até a idade adulta.
Estratégias para minimizar a aderência dos jovens aos dispositivos eletrônicos estão sendo debatidas por estudiosos. O aumento dos preços, a restrição do uso em locais fechados, campanhas educacionais e restrição de sabores são alguns das opções viáveis para o controle epidemiológico dessa doença.
- Referencia
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